quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Uma iniciação ao instante de ver o tempo de compreender e o momento de concluir (encerrar) o tempo de compreender.




O TEMPO LOGICO DO RACIOCÍNIO SILOGISTICO QUE INCLUI O RACIOCINADOR,
OU DE UMA PESQUISA DA MENTE QUE INCLUI O PESQUISADOR

         Porto Alegre, setembro 1989-agosto 2009.

         Advertência ao leitor: O texto de Lacan, “O tempo lógico de asserção de certeza antecipada” serve-se de problema, onde aparecem três detentos e cinco etiquetas, três brancas e duas pretas. Isso tem oferecido muitas dificuldades de estudo e de aprendizagem, hipocritamente dissimuladas, chegando-se ao ponto de se dizer que o tempo lógico da duração das sessões dos tratamentos psicanalíticos nada têm a ver com essa lógica nova que Lacan acrescenta à lógica clássica.
         Nathalie Charraud diz: “Esse artigo traz uma aquisição e um carência teóricas. 1) A aquisição é a formulação desses três tempos, que encontramos ao longo dos ESCRITOS =[e SEMIINÁRIOS] e que terá um papel teórico e técnico essencial. As  análises dos textos ‘Intervenção sobre a transferência’ e ‘Seminário sobre a carta roubada’, apoiam-se, com efeito, sobre essa estrutura, e se apoiam também, sobre essas estrutura, as discussões sobre a duração das sessões e sobre o término de uma psicanálise. || 2) A carência teórica refere-se à ‘mensuração comum’ (commune mesure) do tempo lógico. O termo de ‘intersubjetividade’, tomados da fenomenologia, virá provisoriamente completar essa concepção nos artigos =[e Seminários] dos anos de 1953-1956. Em Função e campo da fala e da linguagem e O seminário sobre a carta roubada, esse conceito se torna um pouco pau para toda obra acompanhando frequentemente as numerosas referências de Lacan à teoria dos jogos.” (in Lacan et les mathématiques, p. 15)

         Antes de retomarmos o estudo e aprendizagens desse texto lacaniano, proponho, como propedêutica e protréptica, o mesmo problema, mas com dois detentos e três etiquetas.
        

Era uma vez dois prisioneiros. O diretor da prisão propôs-lhes um problema. Quem resolvesse o problema, ficaria livre da prisão. A resolução do problema não poderia fundar-se em argumentos prováveis, mas somente em argumento lógicos, certos, imbatíveis.
O problema foi o seguinte: o diretor tinha três etiquetas, duas brancas e uma preta. Grudou uma etiqueta nas costas de cada um dos dois prisioneiros e escondeu a outra.
Partindo da observação de um pelo outro, reciprocamente, cada um dos dois detentos deveria deduzir a cor da etiqueta grudada nas costas de si mesmo.
         As possibilidades logicamente são duas e não mais do que duas, a saber:
         .01 - um tem etiqueta branca e outro tem etiqueta preta;
         .02 - um tem etiqueta branca e outro tem etiqueta branca.


         RACIOCINIO PARA A PRIMEIRA POSSIBILIDADE.

         Nenhum dos dois sabe a cor da etiqueta presa nas próprias costas.
         Aquele que vir que o outro porta etiqueta preta, concluirá (imediatamente, instantaneamente, em cima do instante do olhar, sem hesitação) que necessariamente ele próprio está portando etiqueta branca nas próprias costas.
         Esse primeiro tempo é tempo, ao mesmo tempo, tempo do instante do olhar e tempo do tempo de concluir, sem ter que passar pelo tempo do tempo de compreender.
         Todavia, aquele que vir etiqueta branca nas costas do outro, poderia hesitaria, mas, nem tem tempo para tanto, pois o outro, chegado à certeza instantaneamente, parte para a direção do diretor da prisão.
Só poderia concluir algo a partir da hesitação do outro. Mas, esse outro não hesitou. Logo, o portador de etiqueta preta, nessa situação, chega tarde e bailará...


         RACIOCINIO PARA A SEGUNDA POSSIBILIDADE.

         Os dois portam etiqueta branca nas costas. Tanto um quanto o outro, ao ver que o outro porta etiqueta branca, haverá de hesitar. Mas, logo em seguida, por causa da hesitação simultânea e recíproca, cada qual compreenderá simultaneamente, que porta etiqueta branca nas costas. É o tempo segundo, o tempo de compreender. Passado o primeiro tempo, instante do olhar, a hesitação entra no jogo. E aqui a hesitação é hesitação que gera certeza e certeza solidária e global, isto é, aqui, a hesitação recíproca gera certeza!
         O tempo de concluir e o tempo de compreender dão-se simultaneamente.
        
         RETOMANDO O RACIOCINIO DA PRIMEIRA POSSIBILIDADE. Suponha que tu és o portador da etiqueta branca.
         Concluíste que tens etiqueta branca nas costas. Estás salvo! Corres para anunciar ao diretor da prisão o raciocínio empírico fundado na observação direta e imediata. (O outro detento ao ver que tu sais em disparada e sem duvidar nem hesitar, sem te angustiares, sem sofreres nenhum impasse e nenhuma perplexidade, poderá sair em disparada também, mas, tarde demais. Só faltaria ele te ganhar no fôlego e na corrida! Mas, para tua garantia, isto não conta no tempo lógico. Tempo cronológico, durabilidade na prática, essas coisas não passam de tempo astronômico, isto é, tempo linearmente medido. Mas, tempo lógico não é mensurável com o metro chamado cronômetro, ou relógio! Sacou? Tempo lógico ou é ou não é: não é curto nem longo. Não demora para passar nem passa depressa!

         RETOMANDO O RACICINIO DA SEGUNDA POSSIBILIDADE.
         Necessariamente tens etiqueta branca nas costas. Tu hesistaste e não pudeste concluir nada ao teres visto a etiqueta branca nas costas do outro. Mas, viste num segundo momento a hesitação, suspensão e adiamento do outro! Ao tempo do instante do olhar acrescentas o tempo do momento de compreender. Aqui, a dúvida, a hesitação, a angústia, o sofrimento perante o impasse e a perplexidade te salvaram e salvaram o outro, igualmente, ao mesmo tempo e reciprocamente, solidariamente. Ambos fazem este raciocínio: "Se o outro tivesse visto etiqueta preta nas minhas costas, teria concluído instaneamente que ele só poderia ter etiqueta branca. Mas, como não concluiu instantaneamente, pelo contrário, se deteve, hesitou, duvidou, ficou perplexo, se angustiou com o impasse, então não viu etiqueta preta nas minhas costas. Então tenho etiqueta branca nas minhas costas!

        
         CONCLUSÃO  PARA OS PESQUISADORES.

         As pesquisas de controle estatístico não angustiam nunca, a não ser quando o fato não cai no limbo do coeficiente da ignorância, isto é, no coeficiente estatístico, ou margem de erro. Isto é, às vezes, os pesquisadores se angustiam quando a hipótese, a famosa hipótese, tão ciosamente e raciocinicamente antecipada, vem correr perigo! Mas, isto pode ser remediado ao se controlar e forçar o controle das variáveis intervenientes, essas miseráveis intrusas, principalmente quando são do campo da subjetividade, ou formações do inconsciente! Ora, na pesquisas de controle estatístico tudo aquilo que cai na porcentagem de erro ou coeficiente da ignorância ou que é interveniente, tudo isso é descartado, pois que é incontrolável, inantecipável, surpreendente. Assim, tudo fica bem!
         E, como nas leis normativas, se tu não te adeqúas à lei-norma, quem vai mudar não é a lei, serás tu, ficando na possibilidade de seres bem controlado até à possibilidade da expulsão, excomunhão, banimento, morte. Não é assim que se busca e se mantém o poder e sua verdade? Que dizer dos que pesquisam a mente e descartam a sujeitidade e a subjetividade? Ou a tomam como impostora, distorcionadora, viés impuro?
         Mas, a subjetividade na pesquisa, tanto a do pesquisador quanto a do outro, são elementos lógicos para a descoberta da verdade. Não é verdade, pois, que fica demonstrado que a verdade subjetiva é elemento de avanço e não de percalço na pesquisa da mente?

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