segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Escritor solitário e escritor solidário

Escritor solidário que escreve para leitor que escreve


Por jlcaon@terra.com.br 120213070208
Para Carlos Fernando Karnas, jornalista



Um escritor profissional, Donaldo Schuler, certa vez, em comunicação oral e íntima, apontou-me uma diferença entre título e prêmio dados a um escritor. Eu lhe confidenciara minha surpresa perante a mídia que grosseira e frequentemente emprega o termo “título” como equivalente a “prêmio”. Título é um valor imaginário que, em geral, homenageia mais a quem dá do que a quem recebe. Prêmio é valor pecuniário.
Não vou falar, aqui, do escritor profissional de ocasião ou amador de ocasião que escrevem em vista de título. Não descarto, todavia, os que escrevem em vista de prêmio em pecúnia.

E antes de estabelecer algumas diferenças entre escritor profissional e amador, vou falar de algumas funções de escritor, seja esse profissional ou amador.
.01. A função de escritor profissional de ocasião que, em escrevendo, compra dinheiro para o sustento próprio. É o escritor assalariado de uma empresa jornalística, por exemplo, ou o escritor, tipo profissional liberal, que vende, como free-lancer, o artigo ou livro para, obter dinheiro para o sustento próprio.
.02. A função de escritor profissional que, em escrevendo, produz uma obra que perdura, oportunizando-lhe ou não dinheiro para o sustento próprio. Muitos, como Machado de Assis, eram assalariados e escreviam como ele. Todavia, enquanto que os escritos desses escritores ficaram nos jornais, os de Machado de Assis ganharam outros espaços, fazendo parte do patrimônio literário, cultural e artístico da Nação.
.03. A função do escritor, profissional ou amador, que escrevendo paga para ser publicado. Criou-se, nesse país, uma situação muito curiosa. As editoras, aproveitando-se geralmente da vaidade dos escritores, publicam-lhes os escritos, mediante pagamento em pecúnia por parte desses. Os escritores, desse modo, pagam para obter celebridade, isto é, título. Em geral, esses escritores acabam sendo entrevistados na televisão e ficando bem mais conhecidos e bem mais depressa do que o livro, que frequentemente não é ser lido, apesar de ser comprado por leitores que frequentam tardes de autógrafos em feiras promocionais de vaidades ou happy hours de comércio cultural.
.04. Há outras funções, como a dos escritores assalariado pelos órgãos públicos que regem as universidades públicas ou particulares. Esses escritores escrevem mais para obter pontos no currículo do que para contribuir com a pesquisa. Esse tipo de iniciativa subverteu totalmente a estrutura dos congressos. Em época recente, o conferencista de um congresso, era pago para participar em congresso. Com a “democratização” das participações, todo o participante, seja conferencista ou mero participante, paga a inscrição ou presença no congresso, com direito a certificado que contará ponto no currículo. Os programas universitários obrigam os acadêmicos a apresentarem trabalhos nos congressos organizados muitas vezes pelos mesmos coordenadores dos programas universitários. Assim, o acadêmico paga para obter pontos, ou título, igualando-se, embora de forma bem mais dissimulada e talvez mais imbecil, ao escritor identificado pela função anterior, 03. O consumismo de produção que é a etapa mais avançada do capitalismo atual tomou conta da produção intelectual universitária: assim, a produção do consumo se transforma em consumismo de produção também na Universidade.

Fiz essas observações para melhor poder fazer aparecer meu interesse que é o de retomar e desenvolver a literatura epistolar que antes era produzida por meio de cartas e correio comum e que agora pode ser produzida por meio de e-mails e correio eletrônico da internete.
É nesse contexto que diferencio o escritor que em público escreve a leitor que não escreve e escritor que em público escreve a leitor que escreve. O primeiro é escritor solitário; o segundo, escritor solidário.
O escritor solitário pode servir-se de um blog e publicar seus textos sem, aparentemente, se preocupar com as possíveis reações e contribuições dos leitores que lhe escrevem. O escritor solidário, mesmo servindo-se de blog, escreve em função do leitor que também lhe escreve. É o escritor solidário que escreve para leitor que escreve. É com isso que se pode retomar e desenvolver a literatura epistolar que quase desapareceu no contexto das cartas e do correio comum.





4 comentários:

  1. Bem postado o artigo, Caon. Por algumas vezes tentei desenvolver raciocínio como o teu, sem sucesso. Tentei a interlocução com pessoas, ditas escritores, para avançar nesse pensar. Também sem sucesso. Entre membros de determinada Academia de Letras de cidade de SP, tentei propor incursão, que remetesse à troca de mensagens e de temas para o que pudesse ser substancial ao ofício do escritor que se estabelece, e que fosse além da exposição de textos e literaturas vaidosas. Incrivelmente, não obtive qualquer retorno: proposta ignorada. Entretanto, o espaço que identifico como o que dá possibilidades para tal, é o criado e instituído por um psicanalista. E esse, com desenvoltura, aceitação e liberdade, é o que está, neste momento, a instigar e propor esforços para uma solidariedade singular aos escritores profissionais e amadores, sem distinções. A oportunidade nos está aqui. Agradeço. A literatura epistolar me parece ser vertente e instrumento para a confabulação, para o descortinamento daquilo que poderá ainda ser estabelecido. O resultado, adiante, será mérito para escritores e leitores de todas as instâncias. Carlos Fernando

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  2. Carlos.
    Não conheci, conheço e muitos menos conhecerei(isso que sou otimista),alguém que seja mais fiel ao seu desejo que o Professor e Doutor José Luiz Caon.
    Perseguir o desejo é cultivar e reinventar o projeto de viver com qualidade.
    O objeto de pesquisa do Professor é o inconsciente.
    Só é possível chegar ao inconsciente através da linguagem.
    Linguagem essa, falada pelo psicanalisante deitado no divã e escutada pelo psicanalista que fica sentado na cabeçeira do divã em numa sessão psicanalítica de tratamento.

    Mesmo que ninguém ajude,estimule, critique, reconheça e acredita o sujeito segue em frente sozinho escrevendo, pesquisando, trabalhando e apontando, sem jamais desistir por que sabe o poder que tem a psicanálise, o quanto é eficaz.
    Suporta e sustenta com bravura e coragem a preciosidade que é ser singular.
    A psicanálise gera saúde, paz interior, faz pensar, proporciona conforto, resgata o amor próprio e a reponsabilidade.
    Qual é o sujeito que sabendo de tudo isso fica de braços cruzados?
    Aí vem a responsabilidade, a ética que acena como faíscas de luzes e convida o Psicanalista sério e comprometido com seu desejo a lutar, desbravar a linguagem falada, desenhada, gesticulada, desenhada e escrita:seja em laboratório/Clínica, seminários, grupos de estudos presenciais, virtuais, chats na internete, facebook, orkut, blog, site, livros, textos e etc...
    As escrituras Profissionais e amadoras são importantes para o crescimento:
    Muitos escrevem pelo don natural e se dão bem também economicamente.
    Outros escrevem e pagam para se darem bem economicamente por que imitam.
    O suceso até poderá acontecer, mas uma única vêz.
    A escritura e leitura apartir da psicanálise ajuda o cidadão na construção do ser que consequentemente escreverá suas experiências, ajudando a todos.
    Entre todos, sempre existirá alguém que lê. QUEM ESCREVE?
    Em frente infinitamente.
    Abraços. Cenira

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  3. Muito bom o texto.Há algum tempo tenho pensado sobre isso...esta disponibilidade de reflexão veio depois da publicação do Chá das Cinco Livro pouco lido e...rsrs...caro!Depois da publicação percebi qual teria sido a função de tamanho movimento!Valeu!Mas... de certa forma os leitores não nos pertencem.Vez ou outra encontramos alguém que leu alguma coisa de si...num texto que escrevemos.Isso é encantador desde que se saiba dos perigos dos encantos!Há algum tempo é o gosto pelo encontro com isso, que é tão difernete do escrito, que faz com que ainda queira publicar.A economia, que a bem da verdade não é somente psíquica, determina uma impossibildiade de cobrar por isso.Afinal: cobrar sobre...o que? O que se ganha em dinheiro é somente o que se deve para viver.E embora para alguns os escritos os façam imortais ... escrever é diferente de viver.
    Beijo grande
    Adriana Bandeira

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