quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Sein zum Todo (estar à morte, estar à deriva)

"Sein zum Tod" é expressão heideggeriana validamente traduzida em brasileiro por "estar à morte". É próprio da casca de amendoin lançada ao rio ficar à deriva. Estar à morte e ficar à deriva (morte) é finitude do ser humano. Finitude é corte e castração libertadora, como o corte das pálpebras dos olhos do gatinho quando não abrem: corte que liberta a visão!
Sein zum Tod (estar à morte)





Por jlcaon@terra.com.br





Descobrindo a palestra de Julian Marías, descubro que não sou único a explorar o idioma, que sempre deve ser expremido até estertorar e gotejar o que conserva nos arcanos. Em O pensamento heideggeriano da finitude e a desterritorialização do feudo metafísico, Stein é explicito como Marías quanto à expressão “sein zum Tod”.

Essa expressão é traduzida invariavelmente por "ser para a morte". Diferentemente do alemão, no espanhol e português temos o verbo “estar”. O alemão não diz "estar" porque não têm esse verbo". Anexo depois de minhas 250 palavras passagens do texto e endereço do saite da conferência de Marias.

Muitos só vêem em melancolia o existir psicopatológico, sem ver a contribuição das pesquisas filosóficas. Mas, há que se posicionar diante das pesquisas filosófica e clínico-psicopatológica.

A abordagem médica, parecendo exclusiva, se ocupa preponderantemente com o SINTOMA do sujeito. O médico é também doutor (douto), pelo menos debaixo do jaleco. Quando emprega um tempinho nas curtas sessões a que é submetido pelo ainda pouco humanitário sistema de nossa saúde publica, ele pode ouvir também o SUJEITO do sintoma e não apenas ficar auscultando e apalpando, quando de fato ausculta e apalpa. O isolamento da abordagem clínico-psicopatológica de filosófica deve desaparecer.

Queira ou não, o médico é um douto na arte da medicina e na arte de viver.

Ora, mutatis mutandis, o que fazemos os psi? Por quê outros motivos, nos atemos exclusivamente ao SINTOMA do sujeito e não ao SUJEITO do sintoma?







JULIAN MARÍAS: Mas, claro, ser é ser ou estar. Os livros de gramática - em geral - dizem que "ser" é o essencial, o fundamental, o permanente, enquanto que "estar" é o passageiro, o transitório, ou que se trata de um estado momentâneo... Eu me pergunto se quando rezamos o Pai Nosso e dizemos: "Pai nosso, que estás no céu...", queremos dizer que está lá passando as férias? Parece-me que não, se há algo permanente é justamente esse estar no céu. Como podem ver, "estar" tem um sentido radical, real, muito real. Eu tenho feito uma observação empírica, sem maior importância, mas que é bastante iluminadora: quando se diz a uma mulher que ela é muito bonita, ela agradece, mas agradecerá mais ainda se lhe disserem que “está muito bonita”: ao lhe dizer que “é muito bonita”, elogia-se a sua beleza, a sua qualidade estética; mas quando se diz a uma mulher "você está muito bonita", isso significa que "estou me deparando com o fato de que você é realmente muito bonita", o qual é algo concreto, real, eficaz...

Por outro lado, a preposição zu não quer dizer "para", mas "a". Isto é, a expressão "sein zum Tod", poderia ser traduzida por "estar à morte (estar a la muerte)". Qual é a condição dos homens - e das mulheres, evidentemente - não somente quando nos atropela um caminhão ou quando temos pneumonia dupla? O homem está à morte sempre, está na possibilidade de morrer, está em potência próxima de morrer, está exposto à morte: e é isso justamente o que quer dizer "sein zum Tod", estar aberto à morte, estar nessa possibilidade próxima, real, eficaz. Quero dizer portanto que a tradução, que me parece incorreta, de "sein zum Tod" como "ser para a morte" deve-se não tanto a que o tradutor não saiba bem o alemão, mas que não sabe bem espanhol: o que é muito mais grave.

http://www.hottopos.com/harvard4/jmshdg.htm






Um comentário:

  1. Esta é a razão da fé .... estou para a morte .... então quem me ampara neste "estou para a morte", senão o Pai?
    E também a Fé da Razão. ... pois é o mesmo Pai que me colocou no "estou para a morte".

    ResponderExcluir